Estou fazendo um curso sobre redação e, por mais que os temas sejam dissertativos, é quase inevitável surgir uma narrativa.
Cor 1:2
Era uma vez, um rapaz, seu nome era Igor. Igor era um rapaz introvertido, gostava muito de ler e escrever, a ponto de sua introversão se manifestar fisicamente: rosto fechado mas bem delineado, cabelos negros lisos levemente desalinhados para o lado, pupilas miúdas emolduradas pela íris acastanhada, por sua vez emoldurada por um vermelho sangue vítreo devido às sucvessivas horas em frente a uma tela, e estes igualmente emoldurados por grossos aros pretos, que por fim emolduravam seu mundo de sucessivas horas lendo, escrevendo e vivendo em um mundo particular de tweets em seu smartphones, JD Salinger relido no original por meio de seu Kindle, facebook aacessado través de seu netbook, blogs atualizados utilizando seu Xoon... Ao contrário do que a propaganda de seu tablet favorito mostrava, Igor não era um geek on the scene, não era um doutor em física como Leonard que rompera as barreiras do experimentalismo científico e se expôs a uma linda garçonete loira como Penny... Era um romântico, um verdadeiro nerd à moda antiga.
Certa vez, caminhava da Paulista para o Centro Cultural, disposto a despender a preguiçosa tarde de outono aquecendo-se ao sol enquanto lia alguns de suas duas centenas de livros armazenados eletronicamente, segundo sua projeção, levaria cerca de doze anos completos para concluir todas as obras no ritmo que estava. De repente, atravessando o farol da Vergueiro próximo à Rua do Paraíso, Igor viu um linda garota ruiva: cabelos levemente ondulados arrumados em um alto coque sobre a cabeça, traços delicados e lábios finos como se aguardassem outros lábios para se fazerem completos... Lábios esses que o rapaz sonhou serem seus.
Ela encaminhou-se para o Centro Cultural onde, após considerar diversas vezes se seu cabelos estava devidamente arrumado olhando-se no reflexo de uma janela, sentou-se para ler um livro, enquanto o rapaz enamorado recuperava-se. Igor, sentou-se numa mesa, de modo que a pudesse observar sem chamar aatenção e ligou seu netbook enquanto a contemplava. Com as palmas das mãos suando, Igor acessou o wi-fi enquanto surgia em sua mente o questionamento primorida que, antes dele, todos os homens fizeram ao longo de toda a história da humanidade: o que faço agora?
Como convencer uma garota tão linda a se interessar por ele? Se interessar ao menos para que tivessem a oportunidade de se encontrarem novamente. Assim poderia pentear o cabelo com cuidado, se vestir melhor, usar algum desinfetante bucal, pois suas amizades mantidas através de redes sociais não exigiam cabelos arrumados, boas roupas e muito menos desinfetantes bucais. Talvez assim Igor tivesse alguma chance de se mostrar a ela como ele realmente era...
Como ele realmente era... – “Como realmente sou?”
Será que ele mesmo tinha clareza de como realmente era, depois de tanto tempo vivendo uma vida cuidadosamente manufaturada por ele mesmo num universo regulado por teclas de computador (em alguns casos nem por isso, mas por telas touchscreem)? E ainda que fosse capaz de encontrar a si mesmo – “Será que ela se sentiria atraída por quem eu realmente sei quem não sou?”
Esse último pensamento fez com o suor lhe escorresse pela testa, refrigerado pela gelada brisa leve que soprava da 23 de Maio, espalhando-se rapidamente para as axilas e braços quando pensou que a qualquer instante a linda garota poderia levantar-se e partir para nunca mais vê-lo. Precisava se mostrar como realmente não era, mas como ela gostaria que ele realmente fosse... Passou de um estado de pânico nervoso para um estado de pânico contemplativo, observando em cada detalhe da linda garota ruiva algo que lhe permitisse compreender que perfil de rapaz lhe interessaria.
Desconcentrado entre observá-la e pesquisá-la, Igor foi despertado por um som metalizado, “Poker Face” de Lady Gaga alertava no celular da garota ruiva de uma chamada telefônica, ela deixou o livro sobre o banco e levantou-se para atendê-lo. Temeroso que a chamada a levasse definitivamente dali, Igor voltou ao estado de pânico nervoso procurando desesperadamente pelo trecho da letra que ouvira no breve toque do celular, perfis de garotas ruivas no facebook, orkut, google + e twitter, informações sobre esse tal “O Aleph” (que parecia ter sido escrito por Jorge Luís Borges e nao por Paulo Coelho!), os últimos lançamentos de rasteirinhas... – “Mas porque perder todo esse tempo? Tudo se trata de amor...” – Amor... Como despertar o amor? – “Mas, afinal, o que é amor?” – pensou Igor abrindo uma nova tela para pesquisas: encontrou milhões de definições – “Como viver numa sociedade em que o acesso à informação permite que toda definição seja relativizada?”. Tentou cruzar outras informações com a palavra “amor”: cabelo estilo Amy Winehouse, esmalte vermelho cintilante, Paulo Coelho, meia calça, e outras milhõesde possibilidades surgiram: blogs de moda, vídeos no Youtube e até chats com acompanhantes íntimas! Entre abas e telas e pop-ups de sites de pôker on-line e páginas não encontradas e a cada clique, aumentava o tráfego de megabytes, a conexão ficava mais lenta. Entre URLs e hyperlinks, a conexão lenta compensada pelo Chrome cloud computing, Igor abriu seu notebook acessando World Wide Web num IP alternativo com seu G3 e então... Ela havia partido... Talvez para sempre...
“Existe uma esperança numa rede social!” – pensou Igor, afinal, vivemos num mundo muito pequeno, não pelas coincidências, pois a conteporaneidade assassinou o acaso, mas pela conectividade que a a tecnologia nos oferece.. Enquanto fechava as telas e abas pouco a pouco, como se procuresse vestígios daquela linda garota ruiva entre os encombros da Torre de Babel que desmoronara, Igor se deparou um site aberto quase que aleatoriamente durante o frenesi de suas pesquisas que mostrava letras de músicas, entre elas “Monte Castelo” da Legião Urbana:
“Ainda que eu falasse
A língua dos homens
E falasse a língua dos anjos,
Sem amor eu nada seria.”
Clicou sobre o link da música frustrado por tê-la perdido de vista e um site evangélico se abriu com o trecho que inspirou a música, o livro bíblico dos Coríntios escrito por Paulo, o apóstolo, contido na Bíblia Sagrada, a pera fundamental da cultura ocidental e o livro mais vendido do mundo com 6 bilhões de cópias (talvez, não devesse ser comercializado, pois afinal, trata-se de um livro sagrado):
1 Ainda que eu falasse as línguas dos homens e dos anjos, e não tivesse amor, seria como o metal que soa ou como o sino que tine.
2 E ainda que tivesse o dom de profecia, e conhecesse todos os mistérios e toda a ciência, e ainda que tivesse toda a fé, de maneira tal que transportasse os montes, e não tivesse amor, nada seria.
Igor não refletiu num por um momento: teclou rapidamente Alt+F4 e abiu uma nova página acessando o facebook para procurá-la.
Assinar:
Postar comentários (Atom)

Nenhum comentário:
Postar um comentário