segunda-feira, 1 de julho de 2013

Carta aberta aos meus futuros ex-alunos - Salman Khan e a tecnologia (III)

Porém, essas vantagens do método de Khan apresentam dificuldades, como todo método, inclusive e sobretudo, o método que podemos chamar de "tradicional". Mas no caso da Khan Academy, talvez pela própria formação do idealizador do site, sua aplicação às ciências humanas se torna ainda mais difícil.

Por um lado, Kahn consegue sistematizar conhecimentos, o que é, senão desafiador para uma educação investigativa, bastante preciso para uma educação "tradicional" (quero dizer, na qual o professor transmite o conhecimento para o estudante). Aliás, a esse propósito, o que se define como "tradicional", sempre criticada concepção de educação, é extremamente subjetivo, pois a educação está subordinado ao contexto cultural de cada país. Para os interessados, vale muito a pena assistir a esse documentário sobre o país com os melhores índices segundo o relatório PISA, a Finlândia, que precisou, pelas suas condições geográficas, reiventar sua educação após a Segunda Guerra Mundial.


Para as ciências exatas, essa metodologia é extremamente útil, pois se baseiam no conhecimento exato e, portanto, mais sedimentado (ainda que tenhamos erupções absolutamete revolucionárias acerca do conhecimento exato, algo como foi o Vesúvio em Pompéia em 79 para as ciências humanas), sobre o qual os professores desenvolvem explicações práticas, e muitas vezes pragmáticas, sobre as quais os estudantes devem se exercitar através de exercícios. Assim, a Khan Academy acaba se tornado um repositórios de conteúdos/explicações que permite a apreensão desses conteúdos/explicações de forma mais interessante aos estudantes, podendo ser revista e pausada até que o estudante a compreenda. Com a subversão proposta pelo cientista, de deixar as explicações da Khan Academy para serem vistas em casa e fazer as lições de casa em sala de aula, esses conteúdos/explicações se formam conhecimento eficientemente, com o atendimento individual do professor em sala de aula.

Já nas ciências humanas o conhecimento, ainda que também esteja sedimentado, interage com a realidade dos estudantes de forma mais prática, e assim, a Khan Academy acaba se tornando o mesmo repositório de conteúdos/explicações, mas sem essa interação com a realidade dos estudantes que é promovida pelos professores através de discussões que emergem durante a aula trazidas pelos próprios estudantes, não se desenvolve um conhecimento, pois o caráter sedutor da Khan Academy sobre as ciências humanas se limita a um repositório ainda maior de informações completamente desconexas, a internet e sua Big Data.

Talvez seja pretensão demais afirmar, mas me parece que, como já escrevi anteriormente, que o processo de ensino-aprendizagem precisa de sentido para se converter em conhecimento, precisa de curiosidade, precisa de envolvimento, precisa de desafio. Ainda no termo "talvez seja pretensão demais", mas dentro das ciências exatas, esse conhecimento só se torna significativo, ou seja, se torna curioso, envolvente e desafiador a partir de exercícios, já nas ciências humanas isso se dá a partir de discussões. Utilizando uma frase moldada por mim mesmo: "o aprendizado é um trauma bem acomodado", assim, talvez os educadores, sobretudo dentro dos cursos de formação de professores, devessem refletir e estudar mais sobre a formação neurológica de seus estudantes.

Por fim, acredito que a Khan Academy tem contribuições importantes para a educação, mas como tudo que é novo, sua assimilação deve ser feita com cautela, afinal, numa sociedade em transformação tão rápida, é muito difícil compreender os impactos que essas trasnformações podem ter a longo prazo, por exemplo, se as aulas da Khan Academy se tornassem lições de casa e as lições de casa se tornassem lições de classe, como se desenvolveria a consciência coletiva da sala de aula?

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